27 de março de 2010

Meninos e meninas

Quero me encontrar, mas não sei onde estou
Vem comigo procurar algum lugar mais calmo
Longe dessa confusão e dessa gente que não se respeita
Tenho quase certeza que eu não sou daqui

Acho que gosto de São Paulo
Gosto de São João
Gosto de São Francisco e São Sebastião
E eu gosto de meninos e meninas

Vai ver que é assim mesmo e vai ser assim pra sempre
Vai ficando complicado e ao mesmo tempo diferente
Estou cansado de bater e ninguém abrir
Você me deixou sentindo tanto frio
Não sei mais o que dizer

Te fiz comida, velei teu sono
Fui teu amigo, te levei comigo
E me diz: pra mim o que é que ficou?

Me deixa ver como viver é bom
Não é a vida como está, e sim as coisas como são
Você não quis tentar me ajudar
Então, a culpa é de quem? A culpa é de quem?

Eu canto em português errado
Acho que o imperfeito não participa do passado
Troco as pessoas
Troco os pronomes

Preciso de oxigênio, preciso ter amigos
Preciso ter dinheiro, preciso de carinho
Acho que te amava, agora acho que te odeio
São tudo pequenas coisas e tudo deve passar

Acho que gosto de São Paulo
E gosto de São João
Gosto de São Francisco e São Sebastião
E eu gosto de meninos e meninas





Hoje Renato Russo, que nasceu Renato Mandredini Júnior, completaria 50 anos mas os bons morrem cedo e, assim como Cazuza, Renato Russo morreu em decorrência do vírus do HIV em 11 de outubro de 1996.

24 de março de 2010

Sindicato de ladrões

Se eu tivesse assistido antes provavelmente teria me tornado fã de Marlon Brando muito mais cedo.
Nesse filme de 1954 ambientado no cais, Marlon Brando interpreta maravilhosamente Terry Malloy, um ex-boxeador tido por todos como um vagabundo que se juntou ao irmão Charley (Rod Steiger) em seus negócios escusos. A vida de Terry começa mudar quando entra em cena a senhorita Doyle, cujo irmão foi atraído para uma emboscada por Terry mas o que o ex-boxeador não sabia é que ele seria morto em tal emboscada.
Não é preciso dizer que Terry se encanta pelo jeito determinado da senhorita Doyle que se recusa a desistir de descobrir e denunciar o(s) culpado(s) pela morte de seu irmão.
Entretanto o que realmente prende a atenção nesse filme são os negócio escusos. O filme basicamente se propôs a, da forma mais realista possível, retratar um problema epidêmico nos Estados Unidos da época: a infiltração da máfia nos sindicatos estadunidenses.
Embora tenha se proposto a ser um filme realista o final é um tanto romanceado, o diretor declararia mais tarde que tinha consciência de tal fato mas optou por um final que despertasse a esperança no telespectador justamente por saber que estavam longe de extirpar a máfia de seus sindicatos.
De fato nos Estados Unidos de então a coisa tinha alcançado tal ponto que levariam-se décadas para resolver o problema e se faria necessário a criação de legislação penal específica uma vez que a legislação trabalhista não deu conta de resolver tal coisa.
Se isso não é o suficiente para te fazer assistir, talvez saber que o filme foi indicado ao Oscar em dez categorias e venceu oito, foi indicado ao Bafta onde Marlon Brando venceu na categoria de melhor ator estrangeiro, ao Globo de Ouro onde venceu nas categorias de melhor filme - drama, melhor diretor, melhor ator - drama (Marlon Brando) e melhor fotografia - preto e branco, sem falar no Leão de Ouro, seja o suficiente.

13 de março de 2010

A casa dos budas ditosos

O livro de João Ubaldo Ribeiro foi originalmente escrito para a série "Plenos Pecados" da editora Objetiva com o intuito de representar o pecado da luxúria.
Ele narra as aventuras e desventuras de uma baiana já idosa e radicada no Rio de Janeiro. De leitura fácil e divertida o livro interessará especialmente às mulheres liberais e liberadas e aos homens interessados e, quem sabe, interessantes.
Entretanto a "Casa dos Budas Ditosos" não se restringe à uma narração sexual, é possível observar em suas entrelinhas o machismo arraigado na sociedade brasileira até os dias de hoje e os verdadeiros malabarismos das mulheres para driblá-lo, bem como algumas das mudanças de costumes quando o assunto é sexo, especialmente depois do advento da pílula anticoncepcional, e alguns dos dilemas que podem ocorrer em mentes educadas dentro de uma doutrina cristã de culpa e de pecado.
Vale destacar ainda o episódio em que a personagem principal perde a virgindade. Narrado com maestria pela baiana que tenho certeza conquistará você, qualquer semelhança entre ela e as muitas estudantes encontradas não apenas nos bancos universitários mas também nos cursinhos e salas de aula de colegial talvez não sejam mera coincidência. Essa e muitas outras passagens do livro certamente te farão dar boas risadas.
O texto foi adaptado em 2004 por Domingos de Oliveira e Fernanda Torres deu vida ao monólogo criado por ele.
Título: A Casa dos Budas Ditosos.
Editora: Objetiva.
Gênero: Literatura Brasileira- Romances.
Preço estimado: R$35,90.

9 de março de 2010

Lixo

Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo. É a primeira vez que se falam.

- Bom dia...
- Bom dia.
- A senhora é do 610.
- E o senhor do 612
- É.
- Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...
- Pois é...
- Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...
- O meu quê?
- O seu lixo.
- Ah...
- Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena...
- Na verdade sou só eu.
- Mmmm. Notei também que o senhor usa muito comida em lata.
- É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...
- Entendo.
- A senhora também...
- Me chame de você.
- Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo. Champignons, coisas assim...
- É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra...
- A senhora... Você não tem família?
- Tenho, mas não aqui.
- No Espírito Santo.
- Como é que você sabe?
- Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo.
- É. Mamãe escreve todas as semanas.
- Ela é professora?
- Isso é incrível! Como foi que você adivinhou?
- Pela letra no envelope. Achei que era letra de professora.
- O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.
- Pois é...
- No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.
- É.
- Más notícias?
- Meu pai. Morreu.
- Sinto muito.
- Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos.
- Foi por isso que você recomeçou a fumar?
- Como é que você sabe?
- De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo.
- É verdade. Mas consegui parar outra vez.
- Eu, graças a Deus, nunca fumei.
- Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...
- Tranqüilizantes. Foi uma fase. Já passou.
- Você brigou com o namorado, certo?
- Isso você também descobriu no lixo?
- Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel.
- É, chorei bastante, mas já passou.
- Mas hoje ainda tem uns lencinhos...
- É que eu estou com um pouco de coriza.
- Ah.
- Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo.
- É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.
- Namorada?
- Não.
- Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.
- Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.
- Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.
- Você já está analisando o meu lixo!
- Não posso negar que o seu lixo me interessou.
- Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia.
- Não! Você viu meus poemas?
- Vi e gostei muito.
- Mas são muito ruins!
- Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados.
- Se eu soubesse que você ia ler...
- Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela?
- Acho que não. Lixo é domínio público.
- Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?
- Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que...
- Ontem, no seu lixo...
- O quê?
- Me enganei, ou eram cascas de camarão?
- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.
- Eu adoro camarão.
- Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...
- Jantar juntos?
- É.
- Não quero dar trabalho.
- Trabalho nenhum.
- Vai sujar a sua cozinha?
- Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.
- No seu lixo ou no meu?

Este texto está no livro O analista de Bagé de Luis Fernando Verissimo.

7 de março de 2010

O tempo não pára

Ufa! Porque, felizmente, não existem muitas coisas que uma boa noite de sono precedida por algum tempo ocioso na desciclopédia não resolvam meu mau humor passou!
O que não significa que eu voltei a ser a mesma pessoa de antes, nós nunca mais seremos os mesmos porque como já disse o poeta o tempo não pára.

Disparo contra o sol
Sou forte, sou por acaso
Minha metralhadora cheia de mágoas
Eu sou o cara
Cansado de correr
Na direção contrária
Sem pódio de chegada ou beijo de namorada
Eu sou mais um cara

Mas se você achar
Que eu tô derrotado
Saiba que ainda estão rolando os dados
Porque o tempo, o tempo não pára

Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas ideias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

Eu não tenho data pra comemorar
Às vezes os meus dias são de par em par
Procurando agulha no palheiro

Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos brasileiros
Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas ideias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

(Arnaldo Brandão e Cazuza)

6 de março de 2010

Ainda inconstante

Felizmente o que eu falo não se escreve e o que eu escrevo não se grava, mudei de ideia! Sai dessa coisa de mês só com posts sobre mulheres, não que eu não goste delas. Veja bem! Muito ao contrário de tal coisa, gosto muitíssimo das mulheres, alguém já disse que elas tem um trato com Deus, certo? Neste caso eu também tenho e me reservo ao direito de mudar de ideia.
Me reservo ao direito de um monte de coisas, de não atender o telefone quando não estou a fim, de não sair de casa, de dormir o dia inteiro mesmo sabendo que tenho outras coisas para fazer, me reservo ao direito de pensar o que, em quem e quando quiser e somente se quiser. Me reservo até mesmo ao direito de sentir culpa de vez em quando. E de não sentir culpa, porque não? E de não sentir nada, pois não?
E assim, de reserva em reserva vou me reservando, me guardando não sei para quê ou para quem. Erguendo barreiras invisíveis, me protegendo desse mundo cão, cheio de pessoas não confiáveis, que estão logo ali no seu quintal!
Sem mencionar as pessoas doidas, as que não te vêem, não te escutam e as do pior tipo: as que fingem que se importam. Essas sem dúvida são as piores e porque estou em um desses dias em que você caga e anda para o mundo eu espero que todas elas se fodam, se explodam e morram!!!
Tá, talvez eu não queira realmente que elas morram mas não quero vê-las nem ouvi-las, não quero nada!
E em dias assim eu fico péssima, as letras se juntam mas não formam nada que presta e o silêncio . . . Oh o silêncio! Odeio o silêncio.
Aliás odeio um monte coisas.
Mas o que nesse momento me aborrece, porque a impossibilidade de confiar remexeu em montes gigantescos de neuroses ainda não trabalhadas na terapia, o que realmente me aborrece é essa gente doida que acha que em um mês se pode esquecer de tudo e seguir a diante com outra pessoa mesmo que a outra pessoa seja só você mesmo. Me aborrece a incapacidade sempre constante que carrego, desde que tive o desprazer de conhecer a Igreja e a culpa tipicamente católica, de me expressar, de falar com pessoas e me arriscar. Me aborreço comigo mesma e me enlouqueço!! Sei que não existe outro no mundo que seja responsável por minhas angústias, culpas, medos e solidão que não eu mesma.
Eu quero correr, quero gritar mas não quero fugir, o que me faz pensar que talvez a terapia esteja dando os primeiros sinais de que funciona, os meus ouvidos de aluguel. Por que no fundo é isso não? Um par de ouvidos de aluguel e uma boca inconveniente, que diz verdades óbvias e muito incômodas só para te obrigar a lidar com fatos que seria mais fácil esquecer. Mas não se pode esquecer o passado, especialmente quando tomamos consciência de que são todos os nossos ontens que formam o nosso hoje e que impreterivelmente formarão parte fundamental do amanhã.
Talvez, simplesmente me falte a coragem para confiar . . . e nesses dias tudo me aborrece!


4 de março de 2010

Trabalho de homem, trabalho de mulher

No dia 08 março se "comemora" o dia internacional da mulher. Por essa razão decidi que este mês só vai ter posts com essa temática.
Quero começar discutindo o trabalho, meio indispensável para a manutenção, não apenas da sobrevivência mas também e principalmente, da dignidade de todo e qualquer ser humano. Supostamente existem trabalhos de homem e trabalhos de mulher . . .
Foi no século XIX que a divisão de tarefas e a segregação sexual dos espaços alcançou seu ponto alto, buscando definir ao máximo os lugares de cada um.
A identidade social tanto de homens quanto de mulheres é construída através de papéis sociais distintos, ou seja, a sociedade delimita com bastante precisão os espaços em que a mulher pode operar assim como os espaços em que os homens podem operar. No século XIX os lugares que se atribuíram às mulheres foram a maternidade e o lar, sendo a participação no trabalho assalariado temporário, de acordo com as necessidades da família, sempre como um complemento, uma “ajuda” à renda do marido. Esse papel social da mulher sobrevive até os dias presentes. A educação e a socialização dos filhos é uma tarefa tradicionalmente atribuída às mulheres.
Ao homem do século XIX coube o monopólio da escrita e da coisa pública. A escrita feminina era então estrita e específica: livros de cozinha, manuais de educação e contos recreativos, constituem em geral esta literatura. Mesmo nos dias de hoje em que os homens já não detém o monopólio do espaço púbico tanto quanto antes, a participação das mulheres na política, especificamente no Brasil, é ínfimo. Nas ocasiões em que essas mulheres conseguem se eleger acabam “empurradas” para setores como educação e assistência social, que nada mais são do que extensões de seu papel social de mãe e enfermeira, naturalizando-se deste modo um resultado da história.
A sociedade investe pesado na naturalização desses papéis sociais, tenta fazer crer que a atribuição dos afazeres domésticos à mulher é fruto de sua capacidade de ser mãe. Atribuem a fragilidade feminina à sua constituição física e não a sua imobilidade dentro da sociedade.
É evidente que seres humanos nascem machos ou fêmeas, como a maioria dos animais. Mas é através da educação que eles constroem suas identidades sociais e se tornam homens ou mulheres.
E depois a gente conversa mais a respeito! ;)